Não leia, nem republique qualquer coisa que eu tenha escrito antes de 17 de agosto de 2013: são divagações tolas de quem ainda não havia experimentado a dor.
Leia frases de Clara Dawn em O pensador
...quero ser capim na beira da estrada...
qualquer estrada serve - até mesmo uma senda triste...
desde que o vento passe por ela
e esvoeje os meus cabelos com as letras de um poema...
O olho do espelho
Ainda não sei qual é a expressão que me flerta
quando miro minha face no espelho;
desconheço no reflexo esse olho que me enxerga,
que me escruta com a passiva ira dos tempos;
insolente na sombra dos rastros de um vinco.
Com essa mão que explora traços invisíveis na deslembrança de um rosto infante. Chispas de fuligem me alcançam a mente?
Ou são os meus cabelos que agora nascem prateados?
Perdi a superfície vã das coisas simples na esteira da infância,
ou em puberdade senil se encontra o olho branco desse espelho?
Metáfora da esperança
- por Clara Dawn
Ah, eu gosto tanto de gaveta emperrada...
Não importa quantas gavetas funcionais apareçam diante de
mim,
Eu estarei sempre guardando os meus óculos naquela velha gaveta emperrada.
E é verdade que eu não uso óculos,
Mas eu jamais deixarei de insistir com essa coisa má que me
faz tão bem.
Vermelho
Silêncio - por Clara Dawn
No berço da noite
Uma sombra cai num casebre da Terra.
Depois de regurgitar no chiqueiro
o vento
serpenteia debaixo da jaqueira
e no grato asilo da
natureza
É de afã que apodrecem os cheiros.
O pálido cetim da tez
menina
fecha lânguidos olhos
num pesadelo
e túmidos suspiros
arquejam do seio infante:
estos de um sol que
nunca veio.
Na noite, a cantiga
dos tambores de vodu.
Perto, no cinéreo
vapor, a noite desbota
num verso incerto de
um céu sem deus
e a menina desmaia sob as notas do sino do
inferno.
Em penumbra surge de
um dorso pardacento
o sexo flácido
revelado pela luz de uma lamparina.
Dedos longos de um
diabo sagaz rasgam o véu púrpuro
e o lençol do leito
infante agora é rubro
A menina grita!
E late o parco cão
que vela o casebre.
O vento transpira o
odor da lamparina a querosene.
Os tambores do vodu
emudecem.
O cão reza um terço
com as patas na cabeça.
É vermelho o silêncio
da Terra.
Eminência
Chega.
Nada mais anseio da dúvida
nada
mais sublimo na dor, fim
minha
essência transborda de palavras
meu
espírito se tornou leve
e
canta para acalmar o meu coração
é
que nele habita um passarinho
um
que tem o TEU nome
nome
bonito que sussurro todas as manhãs
Oh,
passarinho, declina-te para ouvir-me
mas
ELE está à volta dessas flores todas
e
não deseja atinar incoerências vindas de baixo
está
com o Pai num lugar azul diferente
e não
pode tampouco auscultar eminências
coisa
mais tola tenho rezado
um só mover de Tua cabeça em direção ao choro
meu
mas
para quê
se desesperos
me despertarão
no azul desse Teu céu
casa
de passarinhos multicores
eu perdi
a fé e tenho medo de jamais revê-la
é
que lamento tanto a violência do afastamento
estou
cansada da sombra desse imenso pé de sei lá o quê
e
enfadada do cão que abana o rabo
porque
pensa que estou, para ele, sorrindo
estou
farta desse infindável caminho
que
se ramifica em divagações tantas
exausta
de tudo
de tudo
mesmo, oh, Deus, exceto de Ti
espero
que isso seja sinal de fé.
Minha Pequena
...pequenina mulher,
ainda é só uma menina,
uma parede a se erguer frágil
[tudo invenção]
invenção de sua personalidade
para esconder suas muralhas...
menina, menina, menina...
[não me pertences, deveras]
mas posso reproduzir a impressão que tuas mãos me
causam:
se disser que nunca vi em mão alguma dedos tão
nitidamente dóceis - diria a verdade, eu.
Minha pequena,
se possível fosse dividir-me em partes mínimas e
cada partícula pudesse ser julgada em separado,
certamente cada pedacinho da minha existência seria
uma nota musical para harmonizar a tua vida,
para encher de riso a tua boca...
Ah, o teu riso!
Teu riso é tão puro que não me lembro se de alguma
brisa
senti tamanho favor.
Elegia ao filho morto
Descobri que o silêncio é palpável:
tem cheiro, textura e gosto.
Descobri-o nessas coisas que pertenceram a você
e que agora você pertence à elas.
Descobri que esse silêncio é visível e belo...
[como uma borboleta sem asas]
Mas, e esse sorriso que ainda tens na face? É de troça?
Terá sido a transposição de teu ultimo reflexo?
Não alcanço no silêncio desse riso - o pensamento - o que
tiveste no instante em que vozes imaginárias ou só por ti audíveis,
atinaram-se a mostrar-te uma paz em forma de branco
lençol...
Não concebo que o teu sorriso, vedado por um nó na garganta,
tenha se transformado em epitáfio.
O tempo passa, mas não passa tempo algum.
E é nesse tempo que passa correndo sem sair do espaço
que tento ajuntar letras ambíguas
sobre toda essa benevolência expressa [como sempre] em seu
olhar;
sobre suas asas de anjo que [no último abraço] ergueram-me
do chão...
Espero que um dia você possa perdoar-me por não conseguir
entender
Sua ânsia de pássaro em livrar-se [ cedo demais] da gaiola
da vida.
0 comentários:
Postar um comentário
Grata pelo seu comentário. Volte sempre.