segunda-feira, 22 de julho de 2013

O Silêncio

Descobri que eu gosto mais do silêncio do que das palavras. Surpreendente, uma vez que são palavras que fazem de mim quem sou. É que, no silêncio, há um corpo; há uma face sisuda que às vezes até parece sábia; há uma aura reflexiva e um espírito em plena quietude das emoções... Eu amo o silêncio porque ele não tem vergonha de mostrar sua fisionomia, mas as palavras são multifacetadas e andam para lá e para cá, ora com uma ideia fixa, ora em undergrounds dialéticos. 

Agora mesmo, estou em silêncio, e nesse meu silêncio  há um segredo dentro de um cenário violável: talvez um céu de estrelas coalhado – estrelas promíscuas brilhando risos dourados pra qualquer um;  talvez um poço flechado por um  raio de luz  tênue e oscilante por causa do vento que inquieta a sombra das arvores... Mas pode ser que nesse meu silêncio exista um vale secreto que jamais será revelado a pessoa alguma... Tampouco a mim. Oh, céus!

Hoje eu não desejei inquirir, das palavras, sequer uma concordância. Hoje estou mais para monologar com o silêncio. Gosto da sobriedade dele, ainda que as palavras me embriaguem até que eu caia em desuso.  Às vezes, o silêncio é ensurdecedor, deveras, mas é no silêncio que o olhar dispensa seus enigmas.  Será que o que não é dito, também não é ouvido? Como explicaria assim uma janela de vitral no andar mais alto de um prédio? Cabeça inclinada para baixo, olhando através dos vidros, e eis que uma civilidade se revela, na distância, silente e misteriosa.

Gosto de ficar em silêncio com a minha confusão mental; com a minha ânsia em desvendar meus próprios segredos temporais. Mas há um barulho dentro de mim agora. Uma gritaria – sobras de uma patusca sem freios que invadiu a zona de conforto do sonho. Eu quero cá comigo o silêncio dos ateus, absoluto. Vou coar o meu sonho nesse silêncio, só para ver se, filtrado, ele se odora de realidade. Todavia, penso que é no desembocar dos sonhos que o silêncio emudece na rigidez da face. 

Quando os sonhos fenecem na proa e até mesmo a maré se veste de silêncio, o melhor é ficar quieto, como se não estive na superfície, mas nas profundezas do oceano onde tormenta alguma pode alcançar.  Eu gosto de ficar quieta. Pregada em coisa miúda vegetalmente para esbanjar-me na contemplação do vazio, porque nele encontro tempo para enxergar grandezas trazidas pelo silêncio. Grandezas que nem os pesadelos me podem tirar. 

Há em mim um amor epifânico pelo silêncio. Dele sou a amante insaciável e apreendo-o comigo em horas tantas para ouvirmos nossas canções prediletas. Sentir-me-ia pouco confortável se tivesse que dividir minha preferência musical com o burburinho. 

Mas não se enganem com essa minha mansidão e esse meu recôndito conforto. Que essa minha face de compulsória lenidade não equivoque os meus, pois por mais perene que a tranquilidade em mim apareça, se no exterior demonstro que só a paz me acontece, agita-se em mim, desconfio, um maremoto. De um maremoto não se pode extrair palavras que soem melhor do que o silêncio – então, eu me calo.

(Publicado no jornal Diário da Manhã - DMRevista - Goiânia - Goiás em 22 de julho de 2013)

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